Para começar a semana com descontração. Ao som da orquestra Soledad, Mariana Montes e Sebastian Arce dançam milonga. Cosagrados bailarinos e professores. A apresentação faz parte do evento World starts of Argentina Tango, realizado na Rússia.
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Dança comigo? Primeiro, a aula; depois, o baile. Como os brasilienses estendem o prazer de dançar das academias para a noite da capital
COMPORTAMENTO » Dança comigo? Primeiro, a aula; depois, o baile. Como os brasilienses estendem o prazer de dançar das academias para a noite da capital
Por Maria Júlia Lledó/Revista do Correio
Publicação: 28/05/2010 12:43 Atualização: 30/05/2010 01:46
Que fique claro: tamanha popularidade não significa que os cruzes e aberturas do tango e os giros da salsa são instintivos. Tudo demanda treino e um mínimo de aulas preliminares. Em se tratando de dança, a vantagem é que o processo de aprendizagem também é pura diversão. Pensando nisso, a Revista percorreu aulas e bailes de Brasília e conversou com alunos dançarinos que transformam a vida numa balada.
Descomplicando Gardel
Numa aula
Frio na barriga. Na turma de iniciantes há sempre um número considerável de pessoas temerosas de não conseguir acertar os passos e outra parte confiante de que vai sair dançando na primeira aula. Atento às expectativas da turma, o dançarino e professor Marcelo Amorim traquiliza. “Quero desmistificar o tango porque a maioria das pessoas ainda acha que este é um ritmo muito complicado.”
Enquanto Marcelo escolhe a música que servirá de trilha para a lição do dia, os aprendizes quebram o clima repassando passos básicos, sozinhos, olhando para o espelho. Nada de copiar o colega ao lado. Até porque os passos e giros do tango “vestem” cada corpo como uma peça única. Para que os iniciantes não se percam, alguns monitores percorrem a sala, tirando dúvidas. Para esquerda ou para direita? Passo para frente ou para trás. Muita calma…
Sentir a música talvez seja o primeiro passo. “E música é matemática pura”, diz, com propriedade, a aluna Luciana Ventura, 25 anos. Há oito anos, ela, que cursa matemática na Universidade de Brasília (UnB), não perde um dia de tango. A ideia foi sugerida pelo pai, assim que ela saiu do colégio e deixou de jogar basquete. Não sabe bem como explicar a relação estável que mantém com o ritmo. Ao longo de anos de prática, a mesma preocupação com o equilíbrio do corpo e a estética da dança continuam. Não é como andar de bicicleta. “Se você não pratica, esquece.”
É hora de cavalheiros e damas se posicionarem para dançar juntos. “La música, señores…”, avisa o professor. Atento, ele corrige daqui, dali, mas não interrompe a dança para apontar erros. “Democrático, o tango permite que cada casal dance à sua maneira, correspondente ao conhecimento de cada um”, explica.
Numa milonga
O baile de tango tem nome próprio: milonga. Como um ritual, ele segue regras e códigos. Nada de chamar a dama para dançar estendendo-lhe a mão. O cavalheiro olha para aquela com quem quer dançar, aguarda ser correspondido por olhares e, então, dirige-se à dama para convidá-la. Ambos se deslocam para o salão.
Nos primeiros 10 segundos da primeira música da “tanda” — grupo de três canções do mesmo autor ou compositor — o casal escuta o ritmo e, a partir daí, começam a dançar. Ao fim da terceira canção, entra a “cortina”, um tipo de música diferente, engatilhada pela orquestra ou pelo DJ para que os casais se dissipem, voltem às suas mesas e outra tanda comece com novos pares.
Quando vai aos bailes com a namorada, o engenheiro Henrique Falcão já demonstra a tranquilidade que só a prática traz. “Uma das dificuldades que o cavalheiro enfrenta é confiar que pode conduzir. Esse foi meu maior desafio, mas também foi o que me ajudou a desenvolver autoconfiança”, conta.
Momento de entrega da dama ao cavalheiro, o tango também permite um maior conhecimento e interação entre homem e mulher. “Aprendemos a respeitar, a adquirir paciência, identificar no outro aquilo que não conhecemos. Claro que há atritos (risos), mas na média é produtivo para o casal”, acrescenta Henrique.
E agora, a salsa
Música com tempero
Numa aula
Terça-feira, oito da noite. O professor Bruno Mendes, 26 anos, abre as portas da sala para duas horas de salsa. Os primeiros alunos chegam. Curiosamente, mais homens que mulheres. O crescente interesse masculino acompanha a demanda de mulheres em busca de parceiros na pista de dança. Mais alguns minutos e o professor aperta o play. Bongôs e tambores anunciam a melodia que está por vir. Anunciados pelos instrumentos de percussão, os metais compartilham a movida latina. Agora sim, mais damas e outros cavalheiros se espalham pela sala. Que empieze la salsa…
Os primeiros passos básicos, em frente ao espelho, são individuais. Homens e mulheres seguem as instruções do professor. Todos precisam aprender, individualmente, alguns movimentos. Paciente, Bruno passa e repassa giros e passos. No segundo momento da aula, formam-se os pares, dispostos numa roda. Hora de colocar em prática os movimentos. Depois da primeira música, troca-se de par. A ideia é que todos dancem com diferentes parceiros para “pegar o jeito”.
Numa balada
O ponto de encontro é o bar e restaurante Barcelona. No subsolo, uma taberna à meia luz convida casais e solteiros a arriscar passos ousados e tímidos na pista. Quem não sabe dançar, não tem escapatória. Logo surge a mão de um cavalheiro para chamar a dama para a salsa.
Insinuações ficam de fora em respeito ao parceiro ou parceira. No salão, a história é outra. Aprender novos passos é o grande barato de quem gosta de sair para dançar. “Aquele cavalheiro, aquela dama — eles sabem um certo número de passos. Você constrói sua dança baseada no que você também aprende com outros parceiros. Você está ali pela dança e, se precisar, pode cortar gracinhas”, aconselha a aluna e veterinária Letícia Souza Wanderley, 26 anos.
Nada de ciúme na hora de trocar de par. “Não adianta dançar com apenas uma dama e repetir os mesmos erros. Ou seja, mudando de parceira você aprende mais, e isso para a dama também é importante”, garante o dançarino e professor Bruno Mendes.
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1ª e 3ª sexta-feira do mês
La Milonguita, no Ayala Café, Hotel Sonesta (Setor Hoteleiro Norte). Antes da milonga, a argentina Viviane Alvarez dá uma aula gratuita para os frequentadores.
2º domingo do mês
Entre Sueños, no Núcleo de Dança do Cresça, na 703/903 Sul
Último domingo do mês
A media luz, na Academia de Dança Marcelo Amorim, na 710 Norte
A Media Luz completa quatro anos hoje
Baile de Dança com os melhores tangos
Neste sábado, 29 de maio, baile de dança de salão no Núcleo de Dança do Cresça, localizado na SGAS 703/903 próximo a UDF. Os amantes do tango não podem perder a oportunidade. As melhores orquestras. Das 21 às 22h apenas Tango. Após este horário todos os ritmos inclusive tango. Não percam!
Informações: Oscar Ricarte (Cacá) 8489-4872
Aula de tango beneficiente
Se faltava coragem essa é a oportunidade. O professor argentino Guillermo Abraham e a professora brasileira Ana Szerman ministram aula de tango hoje na Casa da Dança, próximo ao Uniceub. Interessados devem entrar em contato por telefone e levar um pacote de fraldas tamanho P. Não deixe de aproveitar.
Teatro Colón
Após ficar mais de três anos fechado para obras, finalmente o Teatro Colón, em Buenos Aires, reabriu ao público. A abertura, que faz parte das comemorações do bicentenário da independência argentina, aconteceu nesta semana, com direito a apresentações das óperas “La Bohème” e “O Lagos dos Cisnes”.
As apresentações aconteceram no interior do teatro, mas quem ficou do lado de fora assistiu uma bela projeção de imagens em 3D ao ar livre, que cobriram a fechada do prédio histórico. A reabertura do teatro, que foi inaugurado em 1908, reauniu milhares de pessoas na última segunda-feira, 24 de maio.
Mais de mil pessoas trabalharam para restaurar os 60 mil metros quadrados do Colón. A obra incluiu a restauração das 2,5 mil poltronas da sala de espetáculos (recheadas com crina de cavalo) e do lustre de 700 lâmpadas que pesa uma tonelada e meia.
No site oficial do Teatro você encontra a programação. www.teatrocolon.org.ar/
O tango e o resgate das emoções
Raul Cabral esteve em Brasília na última semana para ministrar dois intensivos. Natural de Buenos Aires, o mestre e dançarino de tango é requisitado em diversos países. Em sua breve passagem trouxe informações valiosas sobre a essência e o estilo milongueiro, praticado em qualquer baile que você venha a visitar na capital do tango. O Tango Candango em sua estréia traz uma entrevista exclusiva com Raul Cabral para que você conheça um pouco mais desse profissional e do tango argentino.
Tango Candango- O que te motivou a dançar tango?
Raul Cabral – Havia perdido o meu pai durante a minha juventude. Sentia muitas saudades e um dia ao visitar a minha mãe pedi a ela para ver fotos da família. Em muitas das festas meu pai aparecia nas fotos dançando tango, com o nosso típico abraço. No fim de semana seguinte fui dançar tango em uma das escassas milongas que já existiam naquela época. Na semana seguinte iniciei as aulas com um mestre do tango que ministrava a mesma classe em vários bairros. Fiz todas da semana e dos meses seguintes. Não parei mais. Faz 20 anos.
Tango Candango – Você acredita que é possível ensinar o amor pelo tango?
Raul Cabral – Trato fundamentalmente de transmitir essa paixão pelo tango aos meus alunos. O meu objetivo é que eles se encontrem com os seus sentimentos, suas emoções e recordações. Por muitos anos meu slogan comercial dizia “Descubra tu sentimentos”.
Tango Candango – O que uma pessoa que começa agora a dançar tango deve saber? É uma dança tão difícil mesmo?
Raul Cabral – A informação que transmitem é de que o tango é uma dança difícil, que exige muita habilidade. As imagens públicas – cinema, tevê, jornais- no mundo correspondem a bailarinos de espetáculo. Não se promovem as milongas salvo em meu país. Mas devo dizer que também lá é pouca a verdadeira difusão em comparação com o anterior descrito. É lógico que com essa imagem parece difícil de aprender. Felizmente o boca a boca e o trabalho de professores aumentaram permanentemente a comunidade do tango. Temo pecar pelo orgulho, mais ainda hoje – 25 anos depois do surgimento do tango- não existe uma pedagogia universal. Cada professor ensina o que sabe e o que aprendeu. É importante que os alunos freqüentem as milongas para ter acesso a realidade do baile social. Assim, saberão o que devem aprender.
Tango Candango – O que pode ser feito para melhorar a prática, a performance pessoal?
Raul Cabral– O tango tem um processo que não há como medir com precisão, depende do talento individual, não trata-se apenas de dar atenção para si mesmo. Se bem que é necessário uma auto estima alta, tanto para aprender quanto para bailar. Não ter pressa é o melhor conselho que posso dar. Quanto mais tempo pratiquem, melhor dançarão. Em cada aula ou prática vão conhecer uma novidade em seu corpo. Então para os apaixonados investiguem as suas respostas corporais e a dos seus companheiros. Experimentem como mover e como permitir o movimento.
Tango Cadango – Quais são as milongas que você costuma freqüentar em Buenos Aires?
Raul Cabral– Cada vez estou menos no meu país. Quase sou um turista, mas quando estou em Buenos Aires sou um furioso freqüentador das milongas. As vezes por simpatia com os organizadores, outras porque sei quem são os freqüentadores ou por determinado DJ. O importante é que cada um encontro o seu lugar, porque o que me agrada não necessariamente agrada os outros. As preferidas são: Gricel (segunda), Porteño y Bailarin (terça e domingo), Niño Bien (quinta), Parakultural Salón Canning (sexta) e Cachirulo (sábado).
Tango Candango – Quais são as suas orquestras preferidas?
Raul Cabral – Toda a discografia de Carlos Di Sarli, dos anos 20 aos anos 50, Osvaldo Pugliese, Osvaldo Fresedo e Miguel Caló. Prefiro a linha melódica sobre a rítmica, faz quatro anos que danço a melodia.
“Recuerden:a la búsqueda en el tango de las emociones, no a las acciones. Ha encontrar el placer, y no el movimiento. Ha abrazarse con afecto, y no tomarse con los brazos. Ha ofrecer sus corazones, lo mejor que tienen y no al maltrato. Atentamente”, Raul Cabral.